No leito da memória

DONANTÔNIA é o rebento de uma caçada no delicado solo da memória, que, vagarosamente, desvela as camadas de um passado vivido, lembrado e revolvido. Na casa da recordação, é preciso andar aéreo para não destruir os vestígios de uma época antiga, tão frágil, que até a lembrança se confunde com a fantasia; não se sabe mais ao certo a diferença entre vigília e devaneio, realidade e utopia.

Há lembranças que desembarcam do trem acompanhadas de indagações: e se fosse diferente? Então, o pensamento e a imaginação nos mostram um infindável mundo de possibilidades. Algumas memórias parecem chegar de um passado tão distante que ultrapassam o indivíduo e adentram no domínio ancestral.

O Tempo, em largas passadas, corre de si próprio e inventa paisagens, novas passagens que se encontram para deitar num leito comum, o leito da memória. Memórias de Antônia? Não sei mais, ao certo, se apenas de Antônia. Essa casa se parece tanto com a minha; as lembranças que por aqui correm, reconhecem-se não só em mim, mas nos visitantes que chegam e também se recordam delas, embora não por inteiro, já que as lembranças nunca se deixam capturar definitivamente, são livres. As lembranças se reinventam, transformam-se.

Thunay Tartari